Há que documentar o vazio. Agora também em mármore!
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quarta-feira, abril 21, 2004

Masanao Yamazaki e os ninjas dos Alpes
Mais histórias de gajos deprimidos, sentados no sofá a pensar em qualquer coisa que não interessa a ninguém.
Série B oriental


Sentado no sofá a rasgar fotografias por sugestão do seu psicólogo, Masanao tenta erradicar as memórias físicas de tempos menos bons. Enquanto ouve o carro da sua namorada partir para não mais voltar, chora e lembra os factos que aconteceram 20 anos antes.

[flashback]

Masanao, um jovem enfezado e míope, vivia com os pais num minúsculo apartamento em Shinagawa, arredores de Tóquio. Masanao tinha problemas na escola onde era ridicularizado e humilhado. Frequentemente era espancado no caminho para casa por colegas disfarçados com máscaras de ski. Masanao não era o único miúdo franzino e feiote da escola, mas era frequentemente visto como uma criança pouco inteligente e pouco faladora. Basicamente era um idiota. Não era anormal nem retardado, era simplesmente idiota.

A origem da má fama de Masanao remonta a uma apresentação de um video educacional, em 1982, aquando da projecção de um segmento promocional do turismo de neve na Suiça, um interlúdio entre uma sequência animada do sistema digestivo e uma animação stopmotion de um worst case scenario de uma colisão entre a terra e um asteróide que se desprendera de um cometa ficcional. Ora, no final da sequência, Masanao coloca um dedo no ar e pergunta se na Suiça existem ninjas. Um forte silêncio se abateu sobre a sala. Entre risadas abafadas e estupefacção geral, a professora pergunta: "Ninjas?". Num movimento brusco tipicamente japonês reprimido, Masanao diz: "Sim, aqueles que andam na neve". Toda a gente compreendeu que Masanao confundira ninjas com esquiadores. Coisas de criança, mas como putos que se prezem, a crueldade não se fez esperar e Masanao ficou para sempre com a marca de idiota na testa.

Ao chegar a casa nesse mesmo dia, Masanao encontra a sua mãe, Keiko, a injectar heroína numa veia do pé. Em cima da mesa do quarto, uma foto de família deitada com um pesado arsenal de utensílios de heroínomano. Daquelas fotos 30x20 num dia de sol, com roupas de domingo. Foge de casa a correr e a chorar. No caminho para parte incerta foi novamente apanhado pelos tipos de máscaras de ski que lhe ofereceram 3 semanas de hospital com respiração artificial incluída.

[fim de flashback]