A vista do meu bloc[g]o
Nesta minha janela virada para uma parede, sobre um beco exíguo, contemplo a qualidade de construção do outro edificio. Se colocar o pescoço um pouco além, vejo todas as outras janelas dos edifícios que têm como vista este beco. Todas elas viradas para a parede. Que estranha fisionomia esta. De algumas janelas saem gritos contidos, de outras saem braços, de outras cabeças curiosas... De algumas saem pedidos de ajuda e noutras não mora ninguém, apesar de estarem lá pessoas dentro. Se esticar o braço consigo tocar na parede, mas não consigo alcançar nenhuma janela. São quartos usados de passagem onde apenas algumas pessoas habitam permanentemente. É frequente assistir a brigas entre vizinhos.
Lá em cima, alguns loucos declamam poesia para a parede, ali ao lado uma miúda sacode os lençois. Existe algures ali em baixo um exibicionista que se coloca todo nu sentado na janela. A essa hora são imensas as cabeças que tecem comentários jocosos. A semana passada houve um suicídio.
O cinzento impera, apesar do sol. Nunca um raio de luz aqui acertou e os fotões que cá aparecem chegam sempre por ricochete.
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