Há que documentar o vazio. Agora também em mármore!
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quarta-feira, julho 28, 2004

Excertos da biografia alternativa de José
Hey now, you're an allstar...


Um sol dourado tinha vindo naquele dia acariciar a neve que coloria de branco aqueles cinzentos armazéns de cereais, do outro lado da rua, frente ao palácio. Lenine, já sem poder falar, gravemente doente, ouve a velha porta ranger. A densa madeira adornada com puxadores de ouro era ainda do tempo dos Czares, do tempo em que o velho Lenine, então jovem, vivia no pânico da clandestinidade. Pela porta entra Estaline com uma bandeja de chá e bolinhos. Tentava disfarçar o ar zangado com um olhar de complacência falso. Sabia que o velho Lenine tinha a carta, aquela que queria publicar para o afastar do cargo de Secretário Geral no próximo congresso. Antes da porta fechar, o velho Lenine ainda conseguiu olhar de soslaio o amigo preocupado Trotsky.

Estaline ignorava o velho Lenine enquanto delineava mais umas partes do seu plano de nacionalização agrícola. No entanto não conseguia de pensar naquela miúda de 15 anos que vira uns dias antes na cozinha do seu amigo Dimitri, calceteiro nobre dos palacetes dos suburbios de Sao Petersburgo. Notando que estava a fugir ao plano e que a sua mente começava a divagar, tentou concentrar-se no partido e nos seus planos de modernização acelerada agrícola. Como que inspirado por uma divina mensagem, vira-se de repente para o moribundo Lenine, prestes a monologar aborrecidamente umas palavras:

- Sabes velho, aquele Trotsky não nos serve. Nem um nome decente soube escolher. Trotsky? Que merda de nome é esse? Não é nome que sugira respeito, é mais nome de padeiro de segunda categoria ou de saltimbanco domador de ursos. Eu tenho um tio carpinteiro que uma vez cortou um carvalho junto ao chão, e as estrias da velha árvore revelaram-lhe uma profecia que até agora tenho escondido de ti. Via-se claramente uma imagens em tons de castanho de Rasputine a ser sodomizado por um trabalhado pénis de madeira, cuidadosamente incorporado numas cuecas de seda da Czarina Alexandra, enquanto um grupo de membros bolcheviques, sentados, faziam desenhos para imortalizar a cena.

Lenine bate fortemente, aterrorizado, com o punho na mesa, derrubando uma garrafa que tilinta aos pedaços pelo chão. Trotsky entra quarto adentro assustado. Estaline chama-lhe "filho da puta" entre dentes e sorri sarcasticamente. Ao levantar-se, bate com a cabeça na cómoda e dá um grito de menina. Trotsky solta uma gargalhada sonora e um guarda e alguns membros do soviete tentam esconder uma risada furtiva. Estaline corre para a casa de banho, corando de vergonha. Com a pressa, derrubou um guarda armado que se desmancha rir antes de bater violentamente no chão.

Do lado de fora da casa de banho Trotsky perguntava-lhe se era preciso chamar a mamã para ajudar o menino a fazer chichi, enquanto os guardas, agora deitados no chão, se rebolavam a rir, em espasmos incontroláveis de gáudio. O velho Lenine foi aqui visto sorrir, numa das suas raras alegrias de final de vida.

terça-feira, julho 13, 2004

À conversa com os senhorios
Uma história de coragem sem cães nem criancinhas de olhos grandes

- Sim?
- Boa tarde. Daqui fala do Monte Olimpo.
- Das máquinas fotográficas?
- Não. Do Monte mesmo.
- Ah, é que tenho uma a arranjar e...
- Ahammm...
- (...) Ok, percebo. Aquele do velhote de barbas, não é?
- Mais respeitinho...
- Então e o que queriam?
- Era para dizer que está em número 235 para apanhar com um raio e devido a problemas técnicos e mudança de turno é capaz de ser adiado para amanhã. Era também para dizer que não faça planos...
- Era? Já não é?
- Update para número 37.
- Humpfff

sexta-feira, julho 09, 2004

Ensaios 324j.83b - 1/180s de realidade
Beleza em suspensão

Beleza em suspensão

A tempestade prodigiosa
[loop-back] Pureza foto-voltaica e a satisfação num espasmo

Arrastava-se por entre extensas fileiras de jazigos, procurando não encontrar. Fitava o ponto intermédio, o ponto da ausência absoluta. Até ao infinito se alongavam aqueles carreiros branco-sujo, ensopados parasitas ácidos, corroendo a pedra e a carne. Do céu chovia deus, um deus negro e novo. Uma repulsa, uma malquerença, um dedo esmagou a mesquinha existência humana. Prostou-se de joelhos olhando o sombrio promontório, onde as sepulturas se uniam ao infinito do firmamento. Árvores mortas, funestas testemunhas silenciosas. Nos seus ramos ressequidos e abrasados apenas sobravam os corvos. De olhar ardente e semblantes de raiva, a cara do deus punidor. Não esperavam mais morte, porque mesmo o mal se sacia e a pústula da humanidade haveria de ressurgir para novamente lhe saciar o desejo sófrego de carne morta...

...e do negro se fez espírito, e a mágoa vindimou a opulência e do esplendor se fez sobriedade. Afinal era novamente vida primordial. A oferenda dos deuses.

terça-feira, julho 06, 2004

CHOQUE...

...Silêncio

sexta-feira, julho 02, 2004

Ditados extintos do Chile
Interactividades

Foi nessa luz que se fez negridão. Foram nessas águas ensanguentadas que foram lavadas as lágrimas. Foi nesse vestido branco que caiu o bolor dos tempos. Foi esse olhar que oxidou. Foi esse olhar que congelou num esgar sofrido.